História Ambiental da Bacia do Rio Macacu - RJ
A pesquisa intitulada “História Ambiental da Bacia do Rio Macacu / Recôncavo da Guanabara / RJ: o Maravilhoso, o Exótico e o Comercializável na Mesopotâmia Fluminense Quinhentista” dá início às investigações em história e antropologia ambiental do LabGeo Baixada Fluminense. Objetiva congregar e analisar informações que possam contribuir para o entendimento da relação sociedade e natureza na bacia do rio Macacu (componente do sistema bacia Baía de Guanabara, no Estado do Rio de Janeiro), no período histórico em questão, apontando as alterações e impactos nos ecossistemas naturais e as configurações espaciais resultantes.
A bacia do rio Macacu abarca, atualmente, os municípios de Cachoeiras de Macacu, Guapimirim e Itaboraí. Sofreu significativas alterações na sua rede hidrográfica, entre as décadas de 40 e 60 (século XX), em virtude das obras realizadas pelo extinto Departamento Nacional de Obras e Saneamentos (DNOS), objetivando o saneamento de parte da Baixada Fluminense e a minimização das frequentes inundações.
Obras desta envergadura alteraram a fisionomia de toda a bacia do Macacu. Esta perdeu um de seus mais importantes afluentes – o rio Caceribu - que, atualmente, é componente principal da bacia do mesmo nome, desaguando na Baía de Guanabara, utilizando a foz original do rio Macacu (Instituto Baía de Guanabara, 2002).
O rio Macacu foi unido, em seu baixo curso, ao rio Guapimirim pelo canal de Imunana, desaguando na Baía de Guanabara, com o nome de Guapi. A bacia Guapi/Macacu é responsável pelo abastecimento de água de muitos municípios da porção oriental das terras do Recôncavo da Guanabara, até os dias de hoje, incluindo a cidade de Niterói (uma das mais populosas do Estado do Rio de Janeiro).
A bacia do rio Macacu é protagonista da história econômica fluminense, entre os séculos XVI e XIX, sustentando os interesses mercantilistas europeus, com a sua farta disponibilidade de recursos naturais. A abundância de pau-brasil em todo o Recôncavo da Guanabara sugeriu o extrativismo da madeira no século XVI, principalmente no baixo curso dos rios, onde a navegação era possível e o transporte da mercadoria facilitado. Neste contexto, a bacia do rio Macacu parece ter se apresentada interessante e promissora.
Ainda no século XVI, a cana-de-açúcar é explorada, inicialmente com mão-de-obra escrava indígena, posteriormente negra africana. Esta atividade se estendeu por todo o século XVII.
No século XVIII, a bacia do Macacu, foi importante apoio no escoamento do ouro, proveniente das minas gerais; além de provedora de madeira para a construção de embarcações (Cabral, 2008). No século seguinte produziu café, conjuntamente com a lavoura de cana-de-açúcar – herança de séculos anteriores (Amador, 1997).
No Brasil pré-cabralino, a bacia do Macacu, habitada pelos índios Tamoios, constituiu a base da vida material e espiritual indígena. No Brasil quinhentista, quando a abundância de recursos naturais em toda a bacia da Guanabara foi percebida pelo europeu, a bacia do Macacu - a mesopotâmia fluminense - com sua rede hidrográfica complexa e navegável, possibilitou a prática extrativista e a produção agrícola, beneficiada pela fertilidade dos solos de baixada.
A história econômica da mesopotâmia fluminense parece, entretanto, ter menosprezado a capacidade de suporte dos ecossistemas naturais locais. A pressão sobre os recursos naturais da bacia do Macacu possibilitou alterações danosas e irreversíveis na paisagem local, construindo uma história ambiental pouca envaidecedora da ação humana sobre o espaço, no que tange à conservação dos ecossistemas locais.
Esta história ambiental, que se construiu na bacia do rio Macacu, foi resultado das relações estabelecidas entre viajantes / colonizadores, populações indígenas, negros africanos, senhores de engenho, instituições religiosas e natureza, travada no bojo da expansão mercantilista europeia, entendedora do valor comercial das tropicalidades brasileiras. Transcendendo à ideia do maravilhoso e do exótico, que povoava o imaginário europeu quinhentista, a natureza tropical da bacia do rio Macacu passa a ser mercadoria, dando início a sua exploração, que só veio terminar com a destruição, quase que completa da vegetação, da fauna e dos recursos hídricos.
Este projeto, optando pela escala temporal correspondente a todo século XVI, investiga um período histórico exíguo de informações acerca da utilização dos recursos naturais na bacia. As alterações na paisagem - compondo uma nova geografia - os impactos na fauna, na flora, nos recursos hídricos e pedológicos são dados pouco formatados e merecedores de atenção por parte dos estudiosos.
O obscurantismo acerca das alterações espaciais, derivadas da exploração dos recursos na bacia do Macacu, no século XVI, incentiva a busca de uma metodologia que possa dar conta do universo socioeconômico e cultural dos atores sociais envolvidos na trama, e fazer da fronteira, da interseção dos universos, um rico material capaz de atender aos intentos deste trabalho. Para tanto, esta pesquisa, metodologicamente, tem como apoio da narrativa as concepções do maravilhoso, do exótico e do comercializável dos primeiros viajantes / colonizadores que aportaram no Rio de Janeiro (em especial na área de estudo em questão), em relação aos ecossistemas locais. Neste sentido, pensa, inicialmente, as transformações espaciais a partir da visão que o colonizador tem acerca da natureza local e de como utilizá-la. O espaço da bacia do rio Macacu, que se transforma no tempo, é vítima e reflexo, no primeiro momento, da visão idílica, fantástica e romântica da natureza local, para constituir-se, posteriormente, em possibilidades concretas de lucro.
Embora a metodologia tenha como ponto de partida a análise crítica das impressões dos viajantes e colonizadores que aportaram pelos sertões do recôncavo guanabarense (em especial na bacia do Macacu), a mesma assume que não pode ser construída a partir de uma única artéria étnica na articulação com a ecologia local. O espaço geográfico e a natureza, que se transforma no século XVI, na bacia do Macacu, são compostos por intencionalidades daqueles que os formatam; neste sentido, vale lembrar a necessidade de uma construção metodológica que possa dar conta de outros olhares e de outras práticas concretas, envolvendo os demais atores sociais que compuseram a sociedade local – indígenas, negros africanos, senhores de engenho e instituições religiosas. A pesquisa assume, então, a necessidade de uma metodologia que possa entender as intervenções sobre o meio natural como fruto de um “hibridismo etnoecológico” na criação de um espaço original e particular: a bacia do rio Macacu - a “mesopotâmia fluminense” - um dos maiores complexos hidrográficos da Baía de Guanabara.
Por fim, cabe destacar: a metodologia trilhada neste projeto é via de duplo sentido. Por vezes, leem-se e interpretam-se as cicatrizes do espaço, fruto da relação sociedade e natureza, para compreender processos históricos; por vezes, estudam-se tais processos que precipitam sobre os espaços, possibilitando o entendimento das formas e funções, registrados pela ação do tempo.sobre os espaços, dando a estes formas e funçistste projeto, sa entender aso Rio de Janeiro.
Para a análise do objeto exposto e para a obtenção de dados, este projeto está apoiado nos estudos em Arqueologia do Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde a autora pleiteia estudos de pós-doutoramento. Nos atuais baixos cursos das bacias do Macacu e do Caceribu, o Museu Nacional estudou 45 sítios arqueológicos, reunindo importante material para subsidiar esta pesquisa. A região, atualmente, sofre as investidas do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – COMPERJ, alterando profundamente a fisionomia espacial local.
Frente aos empreendimentos da COMPERJ, o material arqueológico, reunido pelo Museu Nacional, assim como gravuras, relatos e mapeamentos de época são, seguramente, as únicas fontes de dados atualmente disponíveis.
Ainda com a intenção de realização desta pesquisa e complementação dos estudos em pós-doutoramento da autora, esta vem associar-se, também, ao Departamento de História da Universidade de Lisboa, angariando dados junto ao seu rico acervo documental acadêmico, relativos aos primeiros contatos de viajantes e colonizadores com as terras brasileiras.
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Objetivos
Geral
· Discorrer sobre a história ambiental da Bacia do Rio Macacu – Recôncavo da Baía Guanabara – RJ, no período quinhentista, destacando as alterações nos ecossistemas naturais e repercussões espaciais, produzido pelos diferentes atores sociais do período em questão.
Específicos
· Ressaltar a visão da Europa Renascentista acerca das “maravilhas” naturais do Novo Mundo;
· Discutir as concepções de “maravilhoso”, “exótico” e “comercializável”, acerca da natureza, por parte dos viajantes europeus, na cidade do Rio de Janeiro quinhentista;
· Destacar o confronto entre a natureza imaginada e a natureza encontrada, na área em questão, pelos viajantes / colonizadores europeus no século XVI;
· Identificar e mapear as alterações espaciais na bacia do rio Macacu quinhentista, decorrentes da comercialização das “maravilhas” naturais encontradas pelos viajantes e colonizadores europeus no século XVI.
· Revelar a ecologia política e as políticas ambientais, no período em análise, estabelecidas pela relação dos atores sociais em questão: viajantes/colonizadores, escravos, instituições religiosas e senhores de engenho.
· Apresentar e discutir a capacidade de suporte dos ecossistemas naturais, frente aos interesses comerciais.
· Inferir o peso da degradação ambiental da bacia do rio Macacu, para a decadência da mesopotâmia fluminense.